sexta-feira, 29 de maio de 2015

Do dar crédito às conversas mentais

O momento terapêutico é a dois, e a partilha de aprendizagens não é unidireccional. Sobre a importância que damos às conversas da nossa cabeça, ou pensamentos, o tão afamado "remoer", e como assim deixamos de dar resposta à realidade e de satisfazer as nossas necessidades, uma paciente partilhou a seguinte história comigo:

Um homem queria pregar uns pregos na parede da sua casa quando percebe que não tem martelo. Avisa então a sua mulher que vai pedir um martelo emprestado ao vizinho do rés do chão. Apanha o elevador no 2º andar e enquanto desce começa a pensar - E se o vizinho não me empresta o martelo? Isso é que era uma chatice...mas por que razão não me quereria ele emprestar o martelo? Já lhe emprestei imensas ferramentas. O tipo é um egoísta, nunca empresta nada a ninguém.

Nisto chega ao rés do chão, bate à porta do vizinho e quando este abre a porta diz-lhe - "Enfia o martelo num sítio que eu cá sei!"

Quantas vezes já largou a realidade, remoendo em considerações e deixando de dar resposta aos factos? Vale a pena experimentar o Mindfulness. Por que não começar hoje?

Catarina Satúrio

terça-feira, 19 de maio de 2015

A importância de parar



A Vida anda depressa, por vezes numa velocidade difícil de acompanhar. Entre tarefas, afazeres, deveres, o tempo passa depressa, os dias sucedem-se sem que haja um momento para olhar para dentro de si.

Quando a Vida passa assim, veloz, pode ir perdendo o contacto consigo, a noção do que precisa, esquecendo-se de ouvir. A correria incessante e esta perda de auto-cuidado acumulam-se em inúmeros sinais aos quais não esteve atento. Não, as necessidades, sejam elas físicas ou emocionais, não desaparecem se não lhes prestar atenção. É fácil perceber isso se tomarmos o exemplo da fome. Se ao longo do dia for ignorando os sinais que o corpo lhe vai dando de que precisa de comer, a sensação de fome pode ser alterada, da sensação de estômago vazio ao enjoo, passando por sinais mais sonoros que o seu corpo lhe vai dando. Enquanto não atender a esta necessidade, escutando o corpo, percebendo a mensagem como fome e contactando com o mundo para satisfazê-la, o seu corpo irá continuar em carência em última instância irá desligar. 

O mesmo acontece com as necessidades emocionais - de escuta, de carinho, de partilha, de choro, de riso. Se não for atendendo a estas necessidades inerentes à sua condição humana, pode dar por si em estados emocionais dos quais desconhece a origem ou a ter a sensação de descontrolo emocional.

Importa então saber parar. A questão que se levanta é como conseguir parar numa Vida que se quer tão veloz. Parar não significa deixar de realizar as tarefas a que se propõe, tirando dias de férias ou esperar que chegue o tão desejado fim-de-semana que afinal se revela num sem fim de outras tarefas. Parar significa permitir-se ao longo do dia ir escutando, respirando, regulando-se. Pode ser numa pausa tão simples como 3 minutos em que apenas permanece com a sua respiração, deixando que o ar desça até à sua barriga em vez de permanecer preso na zona do peito como acontece quando se sente mais ansioso. Parar pode ser apenas ir perguntando a si mesmo ao longo do dia "do que preciso neste momento?". Parar pode ser sair da posição inactiva e dar o passo de iniciar um processo terapêutico, cuidando-se.

É natural que mesmo que estas palavras lhe façam sentido e que se proponha a guardar pequenos instantes para se regular, respirando ou respondendo às suas necessidades imediatas, chegando ao fim deste dia repare que se esqueceu de parar. De facto sair de um modo de piloto automático, ou do modo fazer para o modo ser, terá que ser uma prática intencional. Não é algo que aconteça. Neste caso, o recurso às tecnologias poder-lhe-á ser útil. Baixando um aplicativo para o seu telemóvel, como o Mindfulness Bell ou outro que tal, poderá programar um toque (como o de um gongo ou algo mais discreto) de X em X tempo para que o recorde que é tempo de se cuidar.

E se já acumulou um sem número de necessidades não satisfeitas, de emoções que na altura não pode sentir ou se se vê a ter reacções no seu dia-a-dia em que não se reconhece ou que lhe causam sofrimento, que tal dar esse passo em frente e ser hoje o dia em que marca uma consulta de Psicologia. Hoje pode ser o dia em que decide começar a cuidar-se. E eu estou aqui.


Catarina Satúrio
Psicóloga Clínica

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Mindfulness na Gravidez

A transição para a Parentalidade, Ansiedade e Depressão
Cerca de 1 em cada 5 mulheres sofrem de depressão, ansiedade ou outras dificuldades emocionais durante o período perinatal, com cerca de 13 % das mães a sofrer de depressão no período antes ou imediatamente após o nascimento do seu bebé.
Além disso, uma pesquisa levada a cabo em Oxford, no grupo de Psicopatologia e Desenvolvimento Perinatal mostrou que a depressão pós-parto em pais é tão comum quanto em mulheres. Existe uma necessidade premente de encontrar uma forma eficaz de prevenir a depressão pelas suas consequências durante este período crítico: a baixa adesão ao pré-natal; aumento do risco de parto prematuro; aumento do uso de álcool e drogas e problemas conjugais. De todos estes efeitos, a interferência com a parentalidade é particularmente importante dado poder afetar o posterior desenvolvimento da criança.
Qual o impacto no bebé?
A interação precoce entre os pais e os seus bebés estabelece uma base importante para as competências sociais, emocionais e cognitivas posterioremente desenvolvidas pelas crianças. As subtilezas da interação são afetadas drasticamente pela preocupação excessivas dos pais dado que quando embuidos nos seus próprios interesses ou emoções sem estratégias úteis para os gerir, torna-se difícil perceber os sinais momentâneos que os seus bebés lhes transmitem e que formarão a base de apego seguro e desenvolvimento cognitivo.


Mindfulness, Gravidez e Parentalidade
O stress e o humor negativo durante a gravidez aumentam o risco de distúrbios de humor pós-natal, podendo interferir com a vinculação mãe-bebé e desenvolvimento da criança.
Num estudo em que foi usado o protocolo do MBCP (Mindfulness-Based Childbirth and Parenting), as mães que receberam a intervenção mostraram uma redução significativa da ansiedade e humor negativo durante o terceiro trimestre , em comparação com aquelas que não receberam a intervenção. Diferentes pesquisas sustentam que o Mindfulness diminui a depressão e ansiedade durante a gravidez e aumenta a emoções positivas.
O sucesso de intervenções baseadas em mindfulness noutros momentos do ciclo de vida sugere que uma intervenção mindfulness perinatal pode ser igualmente benéfica para as famílias em situação de risco de problemas de saúde mental.
O Mindfulness considera o potencial da atenção plena para os pais que se preparam para o parto, com o objetivo de reverter o impacto negativo que a tensão e o medo têm sobre o as capacidades maternas e o período neonatal. A prática formal de Mindfulness na gravidez, com um programa a que este período se adeque, promove a saúde e competências parentais da família e as relações entre a sua rede de suporte; gestão de ansiedade, dor, stress e depressão e prepara os futuros pais com habilidades específicas para a transição para a parentalidade.
Igualmente, também tem a vantagem de poder melhorar a experiência e aquisição de competências do bebé dado que treina a capacidade dos pais para atender à experiência momento a momento, a auto-compaixão, sem julgamento, para identificar e desconstruir pensamentos ruminativos bem como aplicar o mindfulness às interações parentais.
Desta forma, a prática de Mindfuness tem o potencial de reduzir o risco de depressão perinatal e a ansiedade através do incentivo à aceitação e atenção não-crítica da experiência. Por sua vez tal também poderá reduzir a preocupação dos pais e aumentar a sua capacidade de responder de uma forma sensível aos sinais e necessidades da criança, apoiando assim o desenvolvimento infantil saudável contrariando os efeitos negativos típicos da angústia pós-natal sobre a interação mãe-bebé.
O Mindfulness oferece aos pais a oportunidade de usar o periodo transformador da gravidez e do parto para aprender a ser mindful gerindo o stress, dor e medo que são uma parte natural desta viagem ao desconhecido. Os pais, ao praticar estar no momento presente, tornam-se capazes de viver esta transição de vida com maior confiança, sabedoria e alegria. A prática da atenção plena torna-se não só uma forma de viver a gravidez e o nascimento mas um recurso ao longo da vida para viver com maior consciência, bondade e cuidado.




Dicas para ter uma Gravidez e Parentalidade Mindful
1. Reduza a velocidade
A gravidez pode ser uma grande oportunidade para respeitar o seu ritmo.
Tente evitar ter uma agenda cheia e reserve algum tempo para si.
Se neste momento percebe que demora mais tempo a realizar uma tarefa, espere. Daqui a algum tempo estará a correr entre assentos de carro, carrinhos, transportadoras, para não mencionar as fraldas que parecem sempre ser precisadas de ser mudadas quando se prepara para sair de casa, e uma infinidade de outras pequenas emergências.
As palavras de Thich Nhat Hanh podem tornar-se no seu mantra: "Sorrir , respirar e ir devagar. "
O seu corpo vai apreciar este novo ritmo e o seu bebé (dentro ou fora da barriga) pode sentir a sua ansiedade e também ficar grato se adoptar um ritmo mais calmo.


2. Será como tiver que ser
Conhecer e pesquisar sobre o tipo de parto que você quer é um passo importante para fazer uma escolha consciente. Mas é igualmente valioso reconhecer que muitas vezes as coisas não correm conforme o planeado.
E embora seja verdade que ter um bebé saudável é a coisa mais importante, ignorar ou enterrar a sua resposta emocional face a uma alteração no tipo de parto irá tornar mais difícil a sua aceitação bem como a predisposição para os primeiros momentos de relação com o seu bebé.
Se se confrontar com uma mudança indesejável, veja se pode dar a si mesma um momento para experimentar tudo o que possa estar a sentir em função deste ajuste . Sente-se . Respire . Então, talvez, possa deixá-lo ir .


3. Tenha uma boa noite de sono
É um dos maiores desafios durante a gravidez e os primeiros tempos de paternidade.
Contudo, se se habituar a fazer sestas durante a gravidez, provavelmente será mais fácil continuar este hábito depois do nascimento do seu bebé, aproveitando o tempo em que ele dorme.
E se o sono não vem facilmente, pode tentar algumas práticas de meditação destinadas à consciência corporal.

4. Adapte a sua prática ao bebé
A sua prática de atenção plena irá inevitavelmente mudar quando o bebé nascer.
O que costumava ser uma prática diária de meditação durante 1h pode acabar em 10 minutos de meditação durante a sesta do bebé e 10 minutos de atenção plena da respiração durante a amamentação ou alimentação do seu bebé.
Pode ser que daí por pouco tempo possa voltar à sua velha rotina, mas tendo tempo para fazer breves práticas diárias pode fazer uma enorme diferença no seu nível de energia, paciência e capacidade de se envolver com o seu bebé de forma positiva e consciente.


Catarina Satúrio