sábado, 25 de fevereiro de 2017

Perturbação de Pânico

Diria que a maioria dos meus pacientes, cerca de 90%, chegam até mim na ânsia de um processo terapêutico que sentem como pertinente no tratamento de uma Perturbação de Ansiedade. Seja em forma de Ansiedade Generalizada, ou de uma vivência intensa de Ataques de Pânico, aquilo que não os distingue é esta vontade de resolver, curar, terminar com esta angústia intensa e por vezes permanente que é o viver com medo.

Tento sempre que numa primeira sessão, que é bastante exploratória e de explicação de quem se julga ser, quem me procura leve sempre consigo duas coisas que julgo essenciais - Psicoeducação e Estratégias muito práticas de redução sintomática.

Obviamente que tal não será resolutivo, que há todo um caminho a percorrer. Contudo o saber o que está a acontecer no corpo e como o regular, numa perspectiva quase paliativa, é algo que sinto como dever.

Primeiro porque uma das sensações que encontro como comuns a quem sofre de Ataques de Pânico, é a crença de que estes aparecem "do nada". Como se entende, esta imprevisibilidade agudiza aquilo que já é sentido como um momento de total descontrolo e exarceba o medo de ter medo.

Segundo porque entendo como responsabilidade terapêutica o dotar quem me procura de estratégias práticas que lhe permitam regular-se fora da terapia. O poder reganhar confianças nos próprios recursos parece-me sempre uma mais valia face à postura de sujeição a que a ansiedade num primeiro momento nos pode votar.

Psicoeducação:

Então o que acontece durante uma crise de ansiedade?

Durante um ataque de pânico, quer ele surja em resposta a um pensamento antecipatório ou a uma situação que faz eco numa experiência primária de fragilidade ou ameaça, o cérebro reptiliano é activado. Isto quer dizer que a resposta de Luta ou Fuga do Sistema Nervoso (SNS) é accionado, aumentando então o ritmo cardíaco e encurtando a respiração que se torna toráxica.

Imaginemos que está perante um leão -o seu cérebro reconhece-o como uma ameaça à nossa existência. Assim, o SNS irá aumentar o seu ritmo cardíaco para que tenha mais sangue a circular no corpo e encurtar a respiração para que tenha mais oxigénio disponível. Desta forma poderá atacar ou fugir do leão mais depressa ou com mais força. Percebemos que tanto o sangue como o oxigénio permitem uma mais rápida resposta dos seus músculo, fazendo com que possa correr mais depressa ou atacar com mais força.

Contudo, ao longo da nossa evolução enquanto espécie, e também devido à importância determinista que damos ao conteúdo do nosso pensamento, diria que não temos a capacidade de distinguir automaticamente entre uma ameaça real (a presença efectiva do leão) ou o pensamento de que o leão estará do lado de fora da sua sala (pensamento antecipatório e não factual).

Ora esta não distinção entre uma ameaça real e a antecipação de uma ameaça, faz com que o seu cérebro dê exactamente a mesma resposta face às duas. Ou seja, se acreditar veementemente e de forma não questionada que do lado de fora da sua porta está um leão, o SNS será activado no modo de luta ou fuga. Com uma pequena nuance prática - visto que o leão não está à sua frente, tanto o aumento do batimento cardíaco como o encurtamento da respiração não têm uma finalidade. Não pode nem atacar nem fugir do leão.

Contudo fica com os sintomas - taquicardia, sensação de falta de ar e, devido ao desequilíbrio entre oxigénio e dióxido de carbono provocados pelo encurtamento da respiração, poderá sentir parestesisas (sensação de dormência nas mãos, braço ou face).

O que fazer?

É importante saber que o nosso cérebro possui um quadro de electricidade de baixa potência. Ou seja, quando o cérebro reptiliano está activo, desliga-se o córtex pré frontal, responsável pelo racíocinio lógico. É por esta razão que quando alguém lhe diz "mas está tudo bem, é só um jantar", esta afirmação não acalma a sua ansiedade. É também por isto que quando à posteriori a situação em que estava quando decorreu o ataque de pânico, facilmente emite um julgamento que diz "é uma estupidez, era só um jantar".

Assim, percebemos que temos que usar este quadro de pouca potência a nosso favor, activando o córtex pré frontal e desactivando o SNS.

Para que isso aconteça, pode usar a técnica do A.C.A.L.M.E.-S.E

Poderá também contar de 100 até 0, saltando de 7 em 7 (100...93...86...)

Ou fazer jogos em que a palavra seguinte terá que começar pela última letra da palavra anterior (GatO...OlhO...OvA...Aprendizagem)

Ao dar uma tarefa cognitiva ao seu cérebro, ele receberá a mensagem que precisa de activar o córtex pré frontal e, consequentemente, desactivar o SNS. As tarefas que acima proponho podem parecer-lhe simples neste momento. Porém, aquando de um ataque de pânico, será mais difícil executá-las dado que não é esse o sector do seu cérebro que está activo. Persistir nessas tarefas, permite ao seu cérebro desligar progressivamente as estruturas relacionadas com a ansiedade e ligar as responsáveis por uma raciocínio lógico.


Não poderia terminar esta explicação sem referir a importância de um processo psicoterapêutico com um especialista quando estamos perante um quadro de ansiedade. É neste processo que poderá trabalhar as crenças e o processo de pensamento que são a causa das crises de pânico.

Caso queira marcar uma consulta, estarei disponível através do meu endereço de email (catarinasaturio@gmail.com) ou através do meu contacto telefónico directo - 9144204361.

Um abraço!

Catarina Satúrio



segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Lentes que distorcem a realidade

É a forma como percepcionamos a realidade, e não a realidade em si, que desencadeia as emoções e os comportamentos face a uma situação.

A esta percepção, gosto de chamar lentes que nos filtram a realidade. Como se ao longo da nossa existência fossemos somando lentes às armações vazias com que nascemos. Tal como numa consulta de oftalmologia onde vamos adicionando e experimentando as lentes que melhor nos filtram na realidade.

Claro está que estas lentes (que bem entendido não questionamos e julgamos como verdade absoluta sobre nós e sobre o mundo) foram em tempos defesas e percepções adequadas à realidade vivida.

Imaginemos uma criança que experimenta uma relação com os Pais em que é alvo de críticas constantes sobre o seu desempenho escolar. Facilmente poderemos perceber que crie um auto conceito de ser incapaz em tarefas cognitivas. Poderá também adoptar uma postura de perfeccionismo e intolerância à falha  como defesa desta crítica que tanto lhe doi. Teremos então uma criança que cresce com duas lentes nas suas armações - a de incompetência e a da exigência, que não questionará ao longo da sua existência ainda que lhe cause dano, que seja desligada da realidade e que faça com que a experiência de errar extrapole o erro em si e se alastre para esta noção de ser incapaz.

A experiência emocional daquele erro é de tal forma avassaladora, pois já não se cinge a ele, que acarreta a noção de falhar sempre, de auto critica severa.

Claro está que muitas outras lentes poderiam ter sido adoptadas por aquela criança. Poderia ter desinvestido, desvalorizado as experiências intelectuais por se julgar como incapaz de as cumprir, desistir perante qualquer caminho que percepcionasse como exigente de capacidades cognitivas que julgava não possuir.

Ainda assim, qualquer das lentes que tivesse adoptado, ainda que possamos entender e até empatizar com a razão pela qual foram escolhidas (de certa forma minimizar o sofrimento relacionado com a crítica parental), não seriam já necessárias perante a realidade actual, tornando-se disfuncionais e causadoras de comportamentos desadequados face à realidade hoje vivida. Seriam igualmente causadoras de sofrimento, quando na sua génese seriam protectoras.

Certamente esta será uma análise simplista daqueles que podem ser os pensamentos automáticos e os sistemas de crenças que os acompanham. Ainda assim, julgo importante que possa de certa forma compreender a existência destas lentes e as possa questionar.

No processo psicoterapêutico com uma abordagem cognitiva comportamental, e noutras abordagens que se querem integrativas, o reconhecimento e identificação destes Pensamentos Automáticos, dos Sistemas de Crenças e das Distorções Cognitivas, são parte do que leva à mudança no sentir e no fazer.

Desafio-o hoje a dar-se conta, aqui e agora, destas lentes. E porque não, a trabalhá-las num processo psicoterapêutico.

Um abraço.

Catarina Satúrio


Quem sou?

Quem sou?

Quem sou sem os outros? O que é meu e o que é do outro? Do que me impeço pelas expectativas que julgo que os outros, o mundo têm de mim?

Quando me dou conta, sem julgamento, sem crítica, do que sou, do que me move, apenas aí poderei definir a resposta à próxima pergunta existencial - Para onde vou?